quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Cunha faz leilão com governo e oposição para ver quem dá menos pela ética...

Dou-lhe uma, dou-lhe duas… Eduardo Cunha decidiu levar o impeachment de Dilma Rousseff ao martelo. Recebe lances do governo e da oposição. Promove um leilão às avessas. Entregará a mercadoria ao agrupamento que der menos pelota para a ética. 
O presidente da Câmara dos Deputados iniciou nos últimos dias uma negociação com o Palácio do Planalto para tentar salvar seu mandato. Em troca, ele se comprometeria a não dar o pontapé inicial em um processo de impeachment contra Dilma Rousseff.
Cunha quer a garantia do governo e do PT de que não irá prosperar, a ponto de chegar ao plenário da Câmara, o pedido de cassação dele feito pelo PSOL e pela Rede, que começará a tramitar na semana que vem no Conselho de Ética da Casa. O conselho tem 21 integrantes, sendo 9 do bloco comandado pelo PMDB de Cunha. Somados os 7 do bloco liderado pelo PT, chegaria-se a uma ampla maioria, com 16, mais do que suficiente para barrar a investigação contra o presidente da Câmara.
Cunha tem apelado a aliados e ao governo no sentido de que não seja aprovada a cassação no colegiado. Se isso acontecer, o parecer vai ao plenário da Câmara, em votação aberta, o que deixa a situação fora de controle na visão do parlamentar. Para que haja a cassação, é preciso do apoio de pelo menos 257 dos 512 colegas de Cunha. Que é acusado de integrar o esquema de corrupção da Petrobras, com a suspeita de ter recebido dinheiro de propina em contas secretas dele e de familiares na Suíça.
A oposição, depois de divulgar nota pedindo a saída de Cunha, reuniu-se com ele para informar que, se tocar o impeachment, receberá de volta a presunção de inocência, mesmo sabendo que até a Promotoria da Suíça já não tem a menor dúvida.
O segundo ponto das conversas entre governistas e Cunha gira em torno da saída do ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), apontado por Cunha como responsável pelos vazamentos de informações sobre as investigações contra ele. Nos encontros com governistas, Cunha também sinalizou a dois ministros do Planalto que queria ser absolvido ou pelo menos ter garantias que a Lava Jato "pegue mais leve" com ele, segundo relatos. Os ministros teriam afirmado que, nesse caso, a missão era impossível, que nem petistas foram salvos nessas investigações.
Integrantes da oposição dizem que a tentativa de acordo está claramente em curso. Nesta quarta-­feira (14), alguns já demonstravam descrença de que Cunha vá autorizar a tramitação de um pedido de impeachment contra a petista. Na visão deles, o presidente da Câmara tem chance bem maior de salvar o mandato em acordo com o governo do que em acordo com a oposição, com quem estava bem mais alinhado nos últimos meses.
A esperança manifestada por alguns é a de que o PT não entregue o que Cunha estaria exigindo. Terça, por exemplo, líderes petistas conseguiram evitar o apoio institucional da bancada do partido ao pedido de cassação de Cunha, mas mesmo assim 32 dos 62 deputados petistas assinaram individualmente o pedido do PSOL e da Rede.
Cunha deverá guardar na manga um arsenal para o caso de não receber o prometido, afirmam oposicionistas que conversaram com ele nos últimos dias. Pela lei e por liminares dadas pelo Supremo Tribunal Federal nesta terça, o presidente é o responsável por decidir, monocraticamente, se pedidos de impeachment contra presidente prosperam ou são sumariamente arquivados.
Já é dado como certo por oposicionistas e governistas que ele irá arquivar possivelmente na semana que vem o pedido formulado pelos advogados Hélio Bicudo (ex­-quadro histórico do PT), Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal. Mas ele irá guardar em sua gaveta, sem decisão, pedidos que considera consistentes política e juridicamente, e que podem receber a qualquer momento a "canetada" favorável. Entre eles um novo pedido que Bicudo, Reale, Paschoal e a oposição irão apresentar na sexta-feira (16) e o dos movimentos de rua.
Ainda segundo integrantes da oposição, um dos grandes temores de Cunha é, sem o mandato e o consequente foro privilegiado, cair nas mãos do juiz Sérgio Moro, do Paraná, responsável por aplicar duras condenações na Lava Jato. O peemedebista tem demonstrado preocupação também com implicações em relação à mulher, Cláudia Cruz, e a uma das filhas, cujos nomes aparecem como beneficiárias de contas secretas na Suíça.
Na avaliação dos próprios oposicionistas, caso deflagre um processo de impeachment, Cunha irá enfrentar uma guerra aberta por parte do governo e do PT, que buscará cassá-­lo a todo custo. No caso contrário, ele não terá o mesmo problema em relação à oposição. Apesar de frustrar o desejo de impeachment das siglas contrárias a Dilma, Cunha tem relação pessoal sólida com vários oposicionistas, a quem tem contemplado desde que assumiu a presidência da Câmara, em fevereiro.
Portanto, a principal característica dessa fase sem mocinhos da política brasileira é que tudo está na cara, sem qualquer ambiguidade. Os protagonistas da cena praticam suas vilanias com as melhores intenções. Eles só querem interrromper o pesadelo. Ou prolongar o sonho, dependendo do ponto de vista. A aliança com Cunha seria imoral se todos não estivessem no Brasil - um paraíso no qual sempre é possível reconstruir as consciências e ter uma longa vida pública.
Cunha prolongará o suspense pelo tempo que lhe for conveniente. Não se sabe se haverá Dilma depois do “dou-lhe três”. Mas de uma coisa ninguém duvida: o Brasil do vale-tudo, passará à história como um país em que personagens como Eduardo Cunha são eternos. (com Josias de Souza e Folha)

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